domingo, 8 de maio de 2011

Mónologo da amnésia

De mim, não lembro nada.
Lembro sim que bati a cabeça naquela noite enquanto voltava de um bar.
Lembro que a noite caia triste e o sol já mostrava os primeiros raios.
Sei também que carregava uma espécie de caixa, essa ao lado da minha cama.
Lembro vagamente de ter visto um olhar e um sorriso sincero, sincero, sincero.
Aos poucos me lembro, mas por enquanto, me deixe dormir, me deixe interpretar e assim fingir que bati a cabeça com tanta intensidade capaz de apagar as lembranças. (Seguras lembranças). Me deixe, deixe...
Deixe fazer meu monólogo, meu teatro, me deixe calar quando eu sentir necessidade, mas por favor deixe eu me expressar, porque sou gente, e necessito.
Lembro que carreguei essa caixa pesada por cada canto e lembro de alguém ter me dito certa vez que me achava muito 'forte', apesar do meu porte. Lembro que me disseram pra acreditar, pra esperar, mas chega de perguntas, não lembro de mais nada, por favor se retire e apague essa luz, eu lembro que a intensidade dela ofusca meus olhos, e minha visão já está meio atrapalhada.
Anda logo, tá olhando o quê?

Gente.

Tanta gente vazia, tanta gente cheia, cheia de si própria,
procurando um complemento pros seus dias, buscando o desconhecido, só por acreditar que não se pode completar-se sozinho.
Tanta coleção de histórias, dores, cicatrizes compartilhadas noite a fora.
Gente louca, gente escrota, gente que nem se lembra de ser gente.
Gente que não pensa, gente que só age, gente que só sente, gente como a gente.
Gente que chora, gente que faz a gente chorar, gente que mente, gente que não gosta de gente, gente que se sente.
Cada quebra-cabeça uma peça, cada xarada uma resposta.
Gente sincera, gente 'composta', composta por várias gente's que se revelam dias após dia.
Cada peça um encaixe, cada xarada uma resposta, cada gente caminhando no caminho que acredita, e gente que não caminha, gente que descrê, gente que crê demais, gente que não existe ou prefere fingir que o mundo é que não existe.