segunda-feira, 28 de maio de 2012

Legado.

Já era hora de ouvir falar seu nome em vão, se referiram a ti como se a mim coubesse explicação. Foi-se embora na garupa de um caminhão, levou na trouxa roupa pouca, histórias e canção.
Mas não sabia o pobre homem que na verdade o que eu contei era mentira.
E seguia o seu percurso sem olhar pra trás e lhe custava entender que não voltaria ali jamais, cabeça erguida, passo firme e pensamento vago, lembranças de saudade das noites frias e dos afagos. Deixara o velho amor um pouco de lado, foi viver a vida dupla que sonhara desde menino, matutando foi-se a noite toda em desatino, em desatino e desabafo consigo, comigo e com quem mais topasse no caminho.
Caminho torto, eis a vida dando show, contornando, girando e tudo se encaixou. O velho homem somente dissera que tudo na vida há momento certo a quem não se desespera, e se o que aspiras não vieres não chores ao que talvez não tenha lhe derramado o mesmo.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Imóvel.

Perdeu-se na leitura da estória pelos borrões que as lágrimas haviam causado no bilhetinho, assim o chamara, apesar de ser apenas um pedaço de guardanapo. Sempre fora sensível, exageradamente por vezes.
Diferente das vezes anteriores não houve vestígios de tristeza e nem sombra de dúvidas que não queria mais nem ouvir falar no assunto, nem ouvir, nem ver, nem ler, nem saber, gostaria apenas de viver ali, no seu pequeno mundo resguardado de todo mal.
Enquanto esperava o ônibus, pensou e repensou. Abriu a mala, escolheu mais uma carta para 'apreciar' durante a longa viagem, guardou-a no bolso interno da jaqueta e embarcou.
Fechava os olhos e sussurrava a si mesma de que estava se dando uma chance, tentava se convencer de que não iria errar novamente. Nas paradas da viagem, o drama se repetia, o telefone não tocava, a voz do outro lado da linha não atendia. A poltrona vaga ao seu lado, deixava-a ainda mais apreensiva, foi quando abraçou o sono e acordou já no seu destino.
O telefone tocou, a voz respondeu, aliás respondeu olhando-a parada em meio a pequena rodoviária, e seguiu em direção a ela com o telefone no ouvido e um sorriso na boca pintada.
Abraços calorosos e nada de formalidades, a única novidade era o sentimento da presença.
Foram alguns poucos dias, afundando-se no sofá entre conversas, risos, e tudo de bom que o momento oferecia, a tv ligada e o mundo parando em segundos infinitos, o caos lá fora contradizia a calmaria ali dentro, lá dentro, no mais profundo sentido.
Já não lembrava mais de nada, se desprendeu do que havia trazido, era uma pessoa nova na cidade grande, não sabia o que deveria sentir, mas o sorriso pela manhã já a confortava, lhe assegurava que poderia sentir, porém não.
Chegado ao fim dos poucos e infinitos dias, o embarque foi marcado por lágrimas e promessas, promessas ouvidas outrora, de que iria atrás, iria fazer acontecer de novo.
Sentou-se na poltrona de número bastante sugestivo, e perdeu-se mais uma vez em lembranças, buscou no fundo da mala mal feita as cartas que tinha levado, buscou expressar algum tipo de sentimento, estava imóvel porém, endurecera, talvez fosse o sono.
Queria evitar o assunto, mas não pudera fugir da realidade, já pisou em terra firme e soube o que se passava, o que sentia, o que queria, e nada disso incluía o belo sorriso que conhecera lá na cidade grande, por mais que tentasse impor isso à si mesma.
O sentimento de fracasso veio logo, a possibilidade de ter novamente tudo que planejou também. Perdeu as contas de possibilidades e planos em sua mente persistente, perdeu-se no mesmo lugar em que era fácil se achar, no seu próprio pedaço, naquele abraço antigo das noites frias.
Enfim, voltou pra casa do mesmo modo que foi, só. Consigo só a incerteza do amanhã e do depois e depois. Aprendera contudo, que nada é mais intrigante do que pensar no 'e se...', e foi eliminando as possibilidades da cabeça, e foi varrendo as cinzas, costurando os buracos e se trancando de novo no seu mundo.




"Dê-me seu relógio que eu quero saber, quanto tempo falta para lhe esquecer"